Mais um!
Não entendia porque permitia. Se bem que, dessa vez, foi diferente. Quando percebeu já tinha ouvido, já sabia.
A simples menção da palavra segredo, lhe causou um desconfortável calafrio. Mais um maldito segredo!
Maldito sim, afirmou, afinal raramente alguém segreda coisas ou momentos felizes. Geralmente, os segredos são pesados, cheios de dor e ressentimento.
Sentiu-se sufocar. E, apesar de aparentar estar bem, sua alma caminhou curvada com mais este fardo.
Lamentou ao perceber que carrega-os com excessos. Excessos de peso, de tristeza, de lamento, de dor, de sofrimento.
Ao se descobrir o segredo do outro, sua dor, passava a ser dela também. E isso a desgastava demasiadamente, lhe consumia as forças do espÃrito e da alma.
Ah, os segredos!
Gostaria que fossem leves, para serem carregados com o vento...
Mas são pesados e ficam lacrados aqui dentro!
Chegadas e partidas
dores sentidas
Não quero nada disso
só quero minha vida.
E que ela seja minha
Minhas dores, minhas alegrias.
EgoÃsmo?
Auto-preservação?
Não!
Só quero de volta minha doce solidão...
Sair da rotina sempre a irritava e, estas manhãs quentes, lhe roubavam qualquer resquÃcio de bom humor...
Mas não hoje!
Hoje foi diferente. O frescor do dia raiando lhe trouxe alegria e um ânimo que há muito não experimentava.
Não foi arrumar a casa, como era seu costume sempre fazer... Resolveu cuidar de si!
Olhou envaidecida para sua imagem no espelho e percebeu que os anos não estavam sendo generosos com ela. Os primeiros sinais de flacidez começavam a surgir em seu rosto cansado. A pele manchada retrava os anos de desleixo e maus tratos que impôs a sim mesma.
Procurou todos os recursos cosméticos que dispunha e pôs a cuidar-se. A sensação de tocar-se causou sorrisos de extrema satisfação.
Há quanto tempo não se permitia isso?
Há quanto tempo não se pertencia?
Sempre orgulhou-se por não ser vaidosa e, agora, refletia se, realmente, havia feito as escolhas certas.
Animou-se, novamente, quando observou, demoradamente, seu corpo nú no espelho. Apesar dos anos idos, da falta de exercÃcios e dos filhos vindos seu corpo, ainda, guardava curvas. Curvas que viviam, secretamente, escondidas sob largas e surradas roupas de dona-de-casa.
E então, de um estalo, resolveu arrumar-se. Buscou suas roupas esquecidas, cheirando a mofo de tanto esperar... Retirou um vestido claro e leve e ficou satisfeita ao constatar que, ainda, lhe serviam perfeitamente.
Soltou os cabelos, que se rebelaram em longos cachos. Cachos, finalmente, soltos. Cachos, finalmente, livres que lhe iluminaram o rosto recém tratado.
E ela não coube em si ao perceber o quão bela poderia ser
E assim, decidida e orgulhosa, jurou nunca mais se esconder!